Um conselho na calçada
Há alguns dias, eu caminhava rumo ao restaurante onde costumo almoçar, no intervalo do trabalho, quando dois homens, vestidos com simplicidade — tipicamente pedreiros — subiam a rua do meu local de trabalho: um mais velho, aparentando uns 40 anos, e um garoto que não teria mais do que 20.
Ao passarem por mim, o mais velho dizia ao mais novo, em compasso apressado: “Hoje, meu fi, se o sujeito cochilar, ele não faz nada na vida.”

O risco do “se” acumulado
A frase retumbou na minha cabeça e me pôs a pensar — como de costume — no uso do tempo: o meu, o do outro, o de todos. À medida que o tempo passa, acumulamos mais sonhos, mais “se” entram nas frases e mais frustrados corremos o risco de ficar com o mau uso (ou desuso) do nosso potencial único e da nossa genuinidade — aquilo a que fomos destinados a fazer, com nossa identidade mais profunda. E, quanto mais o tempo passa, mais vejo pessoas o desperdiçando, ainda que muitas vezes cobertas de boas vontades, caminhando de olhos vendados sobre a prancha, rumo à boca do tubarão do esquecimento, da não-realização, da procrastinação, do desalento.
Distração como modelo de negócio
Os tempos modernos de hiperconectividade estão cada vez mais vorazes e insaciáveis. As mídias e seus produtores querem — e precisam — que estejamos distraídos com miudezas e quimeras incontáveis, para que gastemos com eles o que temos de mais precioso: o tempo. E ele passa. As oportunidades passam. A vida passa. O difícil mesmo é fazer com que as frustrações da não-realização de si passem. Elas andam pelo corredor, à margem, esperando uma brecha no fluxo descomunal de assuntos de menor importância para surgirem na corrente principal da vida e nos alertarem.
Um lembrete que vem da rua
Ainda bem que, de vez em quando, passa alguém na rua — gente que nunca vimos, que não sabemos de onde vêm e para onde vão — lembrando questões que, se deixarmos, o tempo leva e não há como reaver. E, na mesma simplicidade e no mesmo compasso do pedreiro — e do tempo — eu termino este texto. Que essa simplicidade nos devolva o foco hoje.
Qual pequena ação adiada você pode fazer hoje?
Conheça mais sobre percepção como forma de comunicação no livro tempo.com – A comunicação esquecida em tempos de Internet.