Bombou nos últimos dias na Internet o comercial da Nissan que promovia sua pickup FRONTIER 4×4, e a virose (não mais coqueluche, como se falava na publicidade) se instalou pandemicamente nas redes sociais fazendo a alegria da galera. O comercial intitulado “Pôneis Malditos” ou “A Maldição dos Pôneis” parece bem criativo e exalta o poder de tração e força do truck da Nissan se comparado aos concorrentes, alegando que estes últimos são veículos tracionados a pôneis, não os poderosos 172 cavalos Nissan. O vídeo promocional é engraçado, informal e com efeitos especiais bem confeccionados.
Para os que não acompanham de perto o segmento publicitário, o CONAR, órgão não-governamental e autorregulador da publicidade, foi acionado e investiga o poder deletério do comercial. Mas acho que o foco do problema vai bem mais longe do que a principal reclamação advinda do comercial, que é a frase de fechamento do vídeo, onde um cavalo animado aparece com os olhos vermelhos simbolizando o mal e diz: “É o seguinte, se você não passar esse vídeo agora para 10 pessoas, você vai sofrer a maldição do pônei: você vai ficar o resto da vida com essa música na cabeça”. A simples união de um elemento sempre vivo no imaginário infantil – o pônei -, com um “cavalo das trevas” é algo que incomodou muita gente. Mas há outros quatro ou cinco vídeos de outros comerciais da Nissan promovendo outros de seus carros em outras categorias, todos disponíveis no YouTube, que mostram igual ousadia, mas todos questionáveis.
Para mim, os comerciais da Nissan trazem o que há de mais comum no meio publicitário: a falta de ética e o excesso de vaidade – dois extremos da beligerância. Infelizmente, muitos publicitários, digo, a grande maioria, não sabe o que é criar. Não têm capacidade criacional, porque criar destruindo não é criar, é rebaixar, é desvalorizar o que existe para atribuir mais valor ao que supostamente parece ser melhor, só porque é fruto da mente de um grupo particular, não de outros.
Que me perdoem todos os publicitários, e posso falar com tranquilidade e segurança, porque sou formado em publicidade, mas essa tal criatividade publicitária está ainda muito aquém daquilo a que se propõe o nosso campo de conhecimento. Criar pequenas frases de efeito, marcas, traços, rococós e rapapés qualquer um faz. Aliás, há programas que fazem isso automaticamente. No meu tempo, e não sou tão velho assim, antes de entrar na faculdade, fui ao SENAC de Belo Horizonte e fiz o curso de Desenhista de Propaganda. Ah, este sim! Você tinha que fazer tudo o que o computador faz, mas na mão, aprendendo todos os conceitos e bases de construção imagética para o processo de criação visual. A parte acadêmica – história, filosofia, sociologia, cinema, rádio, TV, psicologia, fotografia, teoria de massa, e conceitos antropológicos, estes sim, você aprende na faculdade, se for à faculdade, ficar lá, estudar, ler, debater, trabalhar, tirar o melhor dos professores e re-significar seus próprios valores. Se for lá para falar que foi, o resultado é este – um comercial questionavelmente “criativo”, cheio de coisas bacanas e mirabolantes, que você fica pensando: “Puxa, como é possível que se faça isso? Que efeitos legais! Olha o cavalinho, olha o carrossel!”, mas sem ética. Construir algo que supostamente atribui um símbolo positivo para a Nissan destruindo os símbolos de empresas conceituadas como a FIAT, GM, FORD e quem vier pela frente é uma demonstração de mal-querer pelo adversário. As pessoas dessa agência, que não vou citar o nome, não sabem nada de ética e da vida. Sabem papagaiar, fazer efeitos e aplicar as ferramentas de marketing – não podemos negar. Mas isso não é publicidade, é guerrilha, da mais baixa. Nem guerras são assim, pelo menos as “guerras-guerras”, digo, em conflitos medievais, os comandantes de tropa se encontravam dignamente (assista aos filmes Rei Arthur e O Último Samurai),
sem artifícios escusos, e se davam a última chance de palavra na tentativa de rendição do outro pelo convencimento de uma derrota iminente. Não é essa coisa furtiva e traiçoeira da guerrilha, onde preceitos e ética não existem. Guerra por si só não tem positividade, mas há aqueles que conseguem sorver positividade de qualquer negatividade, e me vejo entre eles, por isso exemplifico com a guerra.
O comercial da Nissan é tecnicamente perfeito, mas ética e ideologicamente dentro dos padrões normais de criação publicitária – carente de bases filosóficas, sociológicas, éticas e antropológicas. Faltou a eles assistirem às aulas chatas da faculdade, aquelas que só quem tem muito interesse e verdade no curso assistem.
Quem sabe se aqueles publicitários voltassem para a faculdade e ao invés de torrarem o dinheiro dos pais e respondessem “presente” de viva-voz, ao invés de uma assinatura falsa na lista de chamada e lessem e estudassem, mas acima de tudo, se comprometessem a atingir as premissas do juramento que fizeram, pudéssemos ter propagandas mais simples, mais baratas, que não extorquissem o anunciante, sendo mais reconhecidas pelo consumidor como verdadeira arte de
convencimento, serviço, expressão e progresso, já que convencer, para mim, não é derrotar, é vencer com o outro, é vencer junto. O consumidor, como qualquer ser humano comum, não precisa de efeitos especiais e tiradas sarcásticas, precisa de valores, porque somente valores sólidos sustentam a sociedade e promovem o progresso. É preciso repensar o meio acadêmico no que diz respeito à ética na publicidade, algo que alguns professores infelizmente também não conseguem articular com lucidez e eloquência, visto que também são fruto direto de uma geração na qual o mercado de trabalho era baseado na prática, de algo de quem tinha algum talento criativo e redigia um texto ou fazia uma ilustração e tentava vender o produto. A publicidade fazia tudo “no tapa”, no “peito e na raça”, até justificadamente pela primariedade das coisas, mas agora, mais de um século e meio depois de surgir no Brasil, não se preocupa com o real e quase sempre oferece o mesmo para os consumidores, só que mais embaixo, “nas coxas”. Em tempos modernos, é preciso mudar de verdade e não escutar aquela vozinha da vaidade no pé do ouvido quando se trata de disputa de mercado de consumo.
Legal! Parabéns!
Abs!
Guilherme.
Valeu, cara!
Abraço!